Aos professores – Maurício Rosa de Souza

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Ana acorda todo dia às seis da manhã. Após ter ido dormir às 4h. Toma banho, escova os dentes, põe as roupas na máquina, tira a carne do almoço para descongelar, prepara o café para marido e filhos. E sai.

No meio do caminho descobre que esqueceu um livro importante de atividades. Volta para buscar. Marido e filhos ainda estão à mesa. Pega seu livro e sai.

De manhã são cinco períodos. Sem tempo para um cafezinho, ou um bate papo com os colegas na sala do professor. É de uma sala para a outra. Ana não para.

“Professora eu não entendi essa lição”. “professora quando vai ter prova?” “Professora meu pai disse que se eu repetir o ano, não irei à praia, me ajuda”, “Professora porque não troca de carro?”. “Professora e essa roupa?” “e esse cabelo?” “Minha mãe sai todo dia para trabalhar como secretária e se veste, melhor”.

No banheiro da escola a professora Ana aproveita os minutos do recreio para sentar na privada. Ingere os comprimidos para tratar sua síndrome do pânico, ansiedade e depressão. Sim, isso é uma realidade. Sentada na privada, a professora Ana chora. Porque está olhando as notícias sobre o futuro de sua carreira e a rede social de sua vizinha. Fotos de jantares em locais bacanas, praia, carnaval, viagens culturais, roupas novas, casa nova, carro novo. Então, ela pensa nas frequentes perguntas que os seus filhos fazem e ela inventa as mais mirabolantes mentiras. Mas no fundo ela sabe:

– Não haverá jantar em local bacana porque NÃO TEM SALÁRIO.

– Não haverá praia e carnaval porque NÃO TEM SALÁRIO.

– Não haverá viagem cultural porque NÃO TEM SALÁRIO.

– Roupas novas e casa nova, carro novo? Bom, você já sabe. NÃO TEM SALÁRIO.

Sentada na privada. Enquanto todas as crianças e jovens gritam, correm e conversam, a professora Ana chora porque ganha tão mal que sua terapia é de banheiro. É automedicada. Nem para cuidar do emocional o professor tem salário. E ainda assim, todo dia de manhã, ela acorda, toma banho, escova os dentes, põe as roupas na máquina, tira a carne do almoço para descongelar, prepara o café para marido e filhos. E sai.

De todas as estrelas, a do professor é a que menos brilha. Porém, foi ela que deu energia, em forma de conhecimento, a todas as outras. O universo está mesmo um caos. A greve não é só pelo salário. É pela vida de quem fez a escolha de moldar outras vidas. Todos nós temos a noção de que o professor ganha mal até porque foi ele, também, que nos ensinou a contar, né? E se você chegou ao final desse texto, lembre-se de quem tirou horas e horas mostrando-lhe o caminho para chegar até aqui embaixo.

Empatia, por favor!

 

 


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